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Fernando Grostein Andrade abre o jogo sobre ameaças após lançamento de documentário

Em entrevista com as CARAS, Fernando Grostein Andrade e Fernando Siqueira relembram criação de documentário ‘Quebrando Mitos’

Fernando Grostein Andrade e Fernando Siqueira em entrevista na Revista CARAS - Fotos: Jivi Oxy, Paulo Macedo e Rafa Levy
Fernando Grostein Andrade e Fernando Siqueira em entrevista na Revista CARAS – Fotos: Jivi Oxy, Paulo Macedo e Rafa Levy

Fernando Grostein Andrade irmão do apresentador Luciano Huck e o músico e ator Fernando Siqueira lançaram, há pouco mais de um mês, o documentário Quebrando Mitos. “O filme propõe o conceito de masculinidade catastrófica, ilustrando a ascensão de Jair Bolsonaro como exemplo de o que acontece quando um homem com masculinidade frágil chega a uma posição de poder”, explica Grostein.

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O casal começou a desenvolver o projeto há três anos, desde que deixaram o Brasil por segurança. Grostein, principalmente, recebe ameaças desde 2011, quando lançou o documentário Quebrando o Tabu, que debate a descriminalização das drogas no País, que ganhou uma página de grande sucesso com o mesmo nome.

Em uma entrevista para a Caras, eles explicaram o termo masculinidade catastrófica, termo bastante utilizado no documentário. “É um termo que surgiu ao longo do processo de desenvolvimento do filme. Masculinidade tóxica não nos pareceu suficiente para explicar a masculinidade de homens como Jair Bolsonaro, pois se refere a um homem que causa dano a um indivíduo para benefício próprio, como um cara com as pernas abertas no ônibus lotado. A masculinidade catastrófica é a expansão disso para uma escala maior, trazendo danos a uma sociedade, um país e, no caso do Presidente do Brasil, pela destruição da Amazônia, o planeta inteiro.”, conta Grostein.

Além disso, durante o documentário, eles exibem a história deles, e exibe como foi exibir isso no documentário. “Achei importante dizer de onde venho. Não me identifico muito com documentários em terceira pessoa, narrados por uma “voz de Deus” onisciente – parece que o que está sendo dito é uma verdade absoluta. Achei importante ser sincero com o espectador. Assim, quem assiste sabe qual é o meu ponto de vista, meus pontos cegos e onde meu olhar é mais apurado.”, explica Grostein.

Durante o documentário, Grostein relembra que teve um colapso nervoso durante a gravação e conta o que pode ter dado um gatilho. “ O material de pesquisa do filme é muito pesado. Foram horas de depoimentos de abusos, estupros, violência, suicídio, falas mentirosas, sangue e chacinas. Para quem se preocupa com meio ambiente, para quem é LGBTQ, ou simplesmente para quem é aliado na luta antirracismo, é muito difícil. Dediquei uma vida filmando documentários sobre a linha de frente da marginalização – estudar fake news em oposição, ao que eu vi, foi um mergulho nas trevas. Me senti esgotado, não conseguia assistir a nenhum filme, tudo era gatilho, não conseguia sair de casa direito, ir a lugares barulhentos, enfim. Estava apagado.”

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Siqueira explica como o parceiro o encorajou a seguir em frente quando ele teve o colapso. “Quando o Fê faz um projeto, ele mergulha inteiro. Ele é uma pessoa focada e criativa. Então, observar o documentário criar forma foi muito interessante. Assistimos ao filme diversas vezes e o Fê tinha muito claro na cabeça quando ainda não estava pronto. Então, partia para novas anotações, esboços e estudo.”, explica Siqueira.

Além disso, eles abriram o coração ao falar sobre as perseguições que viviam no Brasil e suas ameaças. “Infelizmente continuo recebendo ameaças, mesmo aqui nos EUA. Não pretendo me calar ou me curvar a fascistas. Todo mundo pode pensar diferente, desde de que não coloque a existência do outro em questão.”, afirma Grostein.

“Mergulhar na música foi uma forma de lidar com tudo isso. Eu e meu marido formamos uma banda, a FS2. O Fernando compôs uma música sobre exílio, Califórnia. Ela está no filme. Música, cultura e esporte têm um papel terapêutico em lidar com traumas.”, continua Grostein.

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Grostein também explica a importância de abordar temas como poder e privilégio dos quais os homens heterossexuais brancos não abrem mão. “Só compreendi essa questão com maior profundidade ao fazer o filme. Percebi como, nos EUA, nunca houve uma presidente mulher. Apenas um negro, todos os outros brancos. Percebi que quando alguém fala de economia na TV, é sempre um homem branco. Liguei os pontos e percebi como a questão da masculinidade atravessa desde a questão LGBTQ até a questão do meio ambiente. Muitos homens se sentem ameaçados, acham que ao questionar a concentração de poder, estamos atacando. Na verdade, a mensagem é: vamos dividir o poder, a diversidade favorece a inteligência coletiva. Todos temos pontos cegos, se as decisões da sociedade (ou do planeta) são tomadas pelos mesmos tipos de pessoa, perdemos ao não enxergar soluções que os pontos cegos delas não alcançam.”

Por fim, eles comentaram sobre a receptividade do documentário em sua geração. “Ele foi bem recebido por todas as gerações. Isso vem também por causa da diversidade na equipe. Percebemos que ele fala de forma mais direta com os LGBTQs e que alguns homens heterossexuais se incomodam além da conta. Quando fazemos uma crítica aos homens heterossexuais, não falamos de todos. Claro que existem milhares de exceções e aliados importantes. Estamos falando do coletivo. E pedindo: por favor, melhorem.” afirma Siqueira.

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